Vyšehrad, Praga, 18 de agosto de 2019 – Edição 25
Pathros: autonomia ou autismo?
Com a recente extinção do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda e sua automática substituição por um novo projeto, autônomo e não relacionado ao anterior, embora homônimo, Pathros lançou a Lusofonia novamente em um alvoroço justificado por suas intenções territoriais.
Baseadas no Tratado de Edimburgo, através de que havia doado à então Escócia os territórios das ilhas britânicas, as mais diversas autoridades pathranas foram às mídias sociais exigir a observância daquele tratado, que estipulava a reversão dos territórios em questão à soberania pathrana à medida em que falisse o projeto britânico. Munindo-se de argumentos rocambolescos, inclusive de que o princípio de que os tratados devam ser cumpridos – pacta sunt servanda – deveria ser observado até por Estados que não são parte do dito acerto, tais oficiais passaram a protestar contra o Estado que agora emerge baseado naqueles territórios que pretendem retomar.
É importante neste momento relembrar o intercâmbio diplomático ocorrido publicamente em maio deste ano entre Alemanha e Pathros quando Nova Corinto ensaiava conversas com o pseudo-estado “Reino da Bélgica”, já finado, o que configurou situação idêntica a esta que agora aflige o governo pathrano. À época, a Bélgica se havia assentado em território sobre o qual vigiam termos estipulados pelo Tratado de Gent, assinado entre Alemanha e Maurícia, o que configurava sua instituição uma afronta aos termos daquele documento e também à soberania alemã. No dia 3 de maio, o Serviço Diplomático Imperial enviou mensagem à Chancelaria Pathrana (link) invocando o Artigo 3º do Tratado de Florença (link) assinado entre Itália, Alemanha e Pathros, que previa cooperação em caso de agressão a qualquer das três soberanias – o que era claro, já que havia reclamação de outro Estado sobre território a qual recai soberania alemã em condomínio com o Governo Maurense.
No dia 6 de maio, Pathros enviou resposta à manifestação alemã em que se negou não apenas a cumprir o Tratado de Florença, mas também informou ao governo alemão que não deixaria de se relacionar com a Bélgica. Nas palavras do chanceler pathrano:
“[…] nós, Pathranos, pregamos o desenvolvimento sadio desse hobbie (sic) e mesmo com as estruturas abaladas não invocamos os mencionados pactos para coibir o Império Alemão de suas ações de aproximação e, sim, incentivamos tal, pois entendemos que todos merecem uma chance de criar seu projeto e desenvolvê-lo. (grifo nosso)”
e complementa:
“Por esse motivo, acreditamos e consideramos válida qualquer interação com micronações, independente de relações conflituosas entre nações aliadas ou reconhecidas.“
Ao violar o Tratado de Florença assinado por si próprio e ignorar o Tratado de Gent, Pathros atestou em tantas palavras quanto necessárias que agiria contra a soberania de nações “aliadas ou reconhecidas”, demonstrando seu total desrespeito pelos mais básicos princípios da convivência internacional, além de se estabelecer publicamente como um Estado em que não se pode depositar qualquer confiança. Agora, ao reverter a posição afirmada em maio e exigir atenção ao princípio pacta sunt servanda que havia optado por desprezar, a Chancelaria Pathrana se confirma como uma organização hipócrita e desmoralizada diante dos demais atores da comunidade internacional.
Uma análise
Para compreender o desconcertante e contraditório posicionamento pathrano nos últimos meses, é importante visualizarmos o histórico da inserção internacional daquele país ao longo de sua história. Desde a abdicação de seu fundador e a assunção de Ninus III, Pathros configurou sua diplomacia pelo alinhamento quase automático aos projetos encabeçados por Itália e Alemanha, tendo sido parte da União Ítalo-Greco-Teutônica, nos idos de 2003, além do Pacto Peregrino, do Memorando de Roma e do Tratado de Florença, todos assinados entre o mesmo eixo Roma-Munique-Nova Corinto. Excetuando-se a Conferência de Nova Corinto realizada em 2006 pelo esforço de Gustav Graves, então chanceler de Pathros por vários anos, a diplomacia daquele país é vazia de realizações ou grandes iniciativas, sendo apenas marcada por uma questionável política de anexações que lhe fez “evoluir” de um punhado de ilhas no Mediterrâneo a deter, além da Grécia, todo o império colonial inglês, passando também por Jerusalém a certa altura, desviando-se de longe de seu desenho helenista original.
Já em 2014, através de decreto, Pathros havia se desprendido de todas as reclamações territoriais detidas para além da Grécia continental e insular, o que recebeu atenção do governo alemão em abril daquele ano (link). A manifestação do Reich, no entanto, gerou mal-estar dentre as autoridades pathranas, que, apesar de terem desafetado dos demais territórios, haviam ali estabelecido reserva pessoal, o que contrariava os princípios da política externa alemã.
Através dos anos, os dois mais recentes monarcas pathranos, Ninus e Vinícius, se mostraram aderentes à posição pathrana de free rider ítalo-germânica, mantendo-se mais atentos aos assuntos domésticos e pouco projetando Pathros de forma autônoma na comunidade internacional. Este cenário muda com a nomeação do atual chanceler, Samuel Cintra, que está atualmente no comando da diplomacia pathrana, e, logo, é o autor do formato atual de sua penetração na lusofonia.
A desengonçada postura de Pathros diante da questão belga, que agora é completamente revertida diante da fundação da nova Grã-Bretanha, reflete uma subjacente mudança paradigmática na forma como Pathros busca se inserir internacionalmente. Se antes o país era alinhado aos acordos movidos por Itália e Alemanha, agora, através de seu novo chanceler, busca uma posição de protagonismo por seus próprios “méritos”, ainda que isso signifique uma total desarticulação de suas relações mais bem consolidadas.
O comportamento antagonista que Pathros exibe hoje é um reflexo da própria persona de seu chanceler, conhecido em outros países por ter personalidade explosiva e inclusive de fomentar ataques digitais contra países que determinava serem inimigos. Falta ao chanceler pathrano, porém, a capacidade de ser organizado e racional: ao instrumentalizar a nova autarquia pathrana através de argumentos que pouco oferecem resistência à lógica e, ainda mais, que alienam parceiros tradicionais, o chanceler confunde intransigência com autonomia e macula de forma indelével a imagem do país que representa. Quando o chanceler de Pathros argumenta em defesa dos interesses pathranos com os exatos argumentos que viu por bem anular com sua lógica defeituosa na ocasião em que foram operados pela Alemanha, demonstra como é frágil sua habilidade para conduzir a política externa de um dos mais antigos países da Lusofonia.
Essa nociva exuberância da Chancelaria Pathrana, contudo, encontra respaldo na postura leniente e desatenta do atual rei Vinícius IV, que, em busca da confirmação de seu país como ator independente e autossuficiente no cenário internacional, permite ao operador de sua política externa que atue fora dos limites do bom-senso e da racionalidade, contradizendo os próprios discursos e transformando Pathros em um pária internacional.
Resta ao expectador atento definir se a busca pathrana por um lugar de destaque na constelação lusófona vai de fato resultar em uma autonomia construtiva, ou, insistindo em renunciar ao acesso a relações sadias que sempre lhe foi garantido por todos os demais Estados, descambará ao autismo diplomático, ausente e apagado. A primeira opção obviamente depende de uma correção assertiva por parte de seu chefe de Estado sobre a nova práxis diplomática pathrana. No entanto, se optarem por permanecer como estão, a segunda alternativa será inevitável.